Em 2023, ao menos oito mulheres foram diariamente vítimas de algum tipo de violência, de acordo com a Rede de Observatórios da Segurança, que reúne organizações da sociedade civil e de pesquisa para monitorar e divulgar informações sobre direitos humanos. Também mostrando que a cada 15 horas uma mulher foi morta em razão do gênero. Majoritariamente, executadas pelas mãos de parceiros ou ex-parceiros. Em 2024, a justiça brasileira informou – por meio do seu Conselho Nacional(CNJ) -, ter recebido diariamente 2,5 mil processos de violência contra a mulher. Ao entorno de 380 mil só nos primeiros cinco meses, em ações que vão desde ameaças, agressões, torturas, ofensas, assédio até feminicídio.
Outros dados, agora, do DataFolha, mostram que 2,4 milhões de mulheres brasileiras sofreram agressões físicas entre junho de 2023 a junho de 2024. E que ‘uma em cada quatro pessoas’ diz conhecer vítimas de violência doméstica, o que corresponde a quase 45 milhões de homens e mulheres que sabem sobre estas agressões, contudo, de alguma forma deixando que se banalize.
Informações que ganham mais contundência quando este levantamento é sobre assassasinatos de mulheres negras, ao apontar que elas representam 62% destas vítimas no Brasil. E que meninas negras de até 13 anos são as maiores vítimas de estupro em um país onde ocorre um estupro a cada seis minutos.
Assim, hoje, dia 20, Dia da Consciência Negra. Data que, igualmente, abre a campanha dos 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, com ações que buscam reflexões sobre os variados cenários da violência de gênero, com a contextualização de suas vulnerabilidades, eu posso falar com profunda tristeza e absoluta preocupação sobre como ainda somos alvos fáceis.
Como mulher, como advogada e, sobretudo, como deputada que faz parte da bancada negra desde a sua criação, em 2023, e uma dos 31 parlamentares que se declaram negros, dos 513 que participam da Câmara Federal, vejo a violência se multiplicar, com casos graves de racismo, além de elevados índices de feminicídio e de homicídio que ainda são rotina para milhares de mulheres negras em todo o país. E mesmo que nossas lutas sejam ininterruptas no Congresso Nacional, esta escalada, em especial, contra a mulher negra têm mostrado possuir muitas camadas, cujos números desafiam especialistas e autoridades das três esferas do Poder.
Desvelando que este racismo estrutural é formado moral e intelectualmente por mais de três séculos de escravidão. Por teorias racialistas que fizeram parte da construção da identidade nacional. Assim, tornando a assertiva feita em 1888, por Joaquim Nabuco, político abolicionista brasileiro ‘que o nosso caráter e nossa moral acham-se terrivelmente afetadas pelas influências com que a escravidão passou 300 anos a permear a sociedade brasileira (…) Desta forma enquanto essa obra não estiver concluída, o abolicionismo terá sempre razão de ser’.
Tirando o velho e empoeirado verniz de igualdade, e deixando à mostra que o racismo ainda hoje não foi enfrentado como deveria. E que o Estado e os governos não interpuseram ferramentas para proteger, de fato, a vida das pessoas negras no Brasil.
Gisela Simona é advogada e deputada federal